Resultados de busca
Viagens privadas com motos e carros de app superam o uso de ônibus, trens e metrô em SP

Os moradores de São Paulo e Região Metropolitana passaram a se locomover de forma diferente na última década. De acordo com um levantamento pela Origem Destino 2023, no Metrô, viagens privadas com motos e carros de aplicativo superam o uso de ônibus, trens e metrô na região.
O levantamento, que visitou 32 mil domicílios nas 39 cidades da Região Metropolitana, é feito a cada década em anos com final 7, mas essa edição foi antecipada para medir o impacto da pandemia na mobilidade urbana.
Em 2023, 51,2% dos deslocamentos diários foram realizados por transporte individual na região — carro, moto, táxis ou carros de aplicativo. Em 2017, na edição anterior do levantamento, o transporte coletivo liderava com 54,1%.
Ao mesmo tempo, a população passou a sair menos de casa no pós-pandemia. Em 2017, eram 42 milhões de viagens diárias (considerados todos os tipos de deslocamentos), número que caiu para 35 milhões em 2023, redução de 15%. O transporte coletivo perdeu três milhões de viagens diárias — a maioria nos ônibus —, enquanto o individual perdeu 116 mil, ainda que a população tenha crescido 2% no período.
Historicamente, o transporte coletivo quase sempre superou o individual, com exceção de 2002, quando o individual chegou a 52,3% dos deslocamentos e o público era 47,7%. Nas pesquisas seguintes, os modais coletivos voltaram a liderar, tendência que só se inverteu novamente em 2023.
O fenômeno se reflete na taxa de mobilidade urbana, que considera quantas vezes por dia a pessoa sai de casa para algum deslocamento: caiu de 2,02 viagens por pessoa em 2017 para 1,68 em 2023. É a primeira vez que há redução nas viagens motorizadas desde 1967, quando foi feita a primeira pesquisa Origem Destino.
As mudanças se deram mesmo com a ampliação da malha metroferroviária. Só de metrô, foram inaugurados mais de 20 quilômetros entre 2017 e 2023.
O ônibus foi o modal mais impactado, com 2,6 milhões de viagens diárias a menos em seis anos. Em paralelo, o subsídio da prefeitura de SP às concessionárias que operam o sistema só aumentou ano a ano, e para 2025 a gestão Ricardo Nunes (MDB) prevê pagar R$ 6,4 bilhões às empresas que operam os coletivos.
O especialista em mobilidade urbana Rafael Calabria afirma que a perda de passageiros era esperada, mas não nesse nível, e que a falta de qualidade do transporte público é um fator que pode explicar a debandada.
— O peso da pandemia é importante, por ter mudado as relações de trabalho e estudo, mas o que se vê é que, principalmente na baixa renda, a redução do uso do transporte público não é por causa do home office, mas uma migração para a moto e para os transportes de aplicativo — ele opina.
Também houve mudanças nos modais não motorizados. As viagens de bicicleta aumentaram 25%, em todas as faixas de renda, o que coincide com um aumento da estrutura cicloviária na região no período. As viagens a pé, por outro lado, mostraram queda de 24%.
O pizzaiolo João Carlos Aparecido Romão, de 38 anos, abandonou o transporte público há dois anos. Morador de Americanópolis, na Zona Sul, ele agora usa a bicicleta para fazer o trajeto entre o bairro e a Avenida Angélica, na área central. Leva 30 minutos, em vez da uma hora que gastava pegando um ônibus e um metrô até a pizzaria.
— Não vale a pena pegar o metrô abarrotado, apertado. Eu gosto de andar de bicicleta, são 30 quilômetros para ir e para voltar. Chegando no trabalho tomo um banho e me arrumo — diz.
Se o transporte coletivo perdeu passageiros, o uso de carros por aplicativos como Uber e 99 disparou: em 2017, eram 368 mil viagens diárias na região, número que chegou a 1 milhão em 2023. As mulheres são quem mais usa esse tipo de transporte (67%). A renda predominante entre usuários do serviço é um salário familiar de R$ 2.640 a R$ 10.580.
As viagens por moto também registraram alta significativa. O número de motocicletas na região cresceu 50% entre 2017 e 2023, passando de 624 mil para 936 mil. Os deslocamentos sobre duas rodas aumentaram 16% no período. O usuário é majoritariamente homem, jovem, com ensino médio completo e salário de até R$ 3,8 mil — mas o número de mulheres cresceu de 7% para 10% no período.
Ao mesmo tempo em que houve aumento nas mulheres pilotando, caiu o número de mulheres passageiras de moto, de 76,5% em 2017 para 65,2% em 2023.
Novas dinâmicas
O jeito de se locomover varia muito a depender de onde a pessoa mora. Dos dez locais de origem com mais viagens de metrô, oito estão na Região Central de São Paulo, onde há mais estações e linhas. A República lidera, com 54 mil viagens diárias. Já os locais que mais tiveram deslocamentos de carro são municípios da Região Metropolitana, com destaque para o ABC. Com 106 mil viagens de automóvel diárias, Santo André lidera a lista. Em segundo lugar, vem Suzano, na Região Leste da Grande São Paulo, com 99 mil viagens diárias.
Luiz Cortez, gerente de planejamento e meio ambiente do Metrô, afirma que ainda não há uma resposta que justifiquem os resultados da pesquisa, mas acredita que as “novas dinâmicas de trabalho e estudo” são fatores importantes.
— O teletrabalho, que já atinge 12%, e o ensino híbrido, seguem impactando a mobilidade. Além disso, a posse de automóveis cresceu, e a taxa de motorização aumentou 19,8% — diz.
Em nota, a SPTrans afirma que o número de passageiros transportados “se mantém estável desde o fim da pandemia” e apontou que tem tomado medidas para tornar “o transporte público mais atrativo e acessível”. “O subsídio é uma política necessária para a manutenção de benefícios como as gratuidades e a integração entre ônibus”, destacou.
Fonte: Redação com o GLOBO